Fazia dias que eu já tinha percebido a sua presença. Sempre calado, apenas cumprimentava os outros voluntários levantando a mão. Alto, de cabelo comprido escuro com um rabo de cavalo bem preso, a barba por fazer e super estiloso, como qualquer outro jovem da sua idade, hoje de manhã ele sorriu e se aproximou.
Se não fosse pela diferença que Abed está varado em um campo de refugiados há 3 meses, esse belo rapaz poderia ser de qualquer lugar do mundo. Desta vez não era eu quem fazia as perguntas para quebrar o gelo, como quase sempre acontece por aqui.
– De onde você é?
– Do Brasil.
– Nice!
– E você?
– Faixa de Gaza, Palestina.
– Uau! Super legal. Você é o primeiro palestino que conheço.
– O que você espera da vida?
– Ahn, como?
– Isso, qual é o seu sonho para você e para todo mundo?
– Ah, ok. Hummm, eu espero ser feliz e desejo paz para o mundo.
– Boa resposta.
– E você?
– Pera, mais uma pregunta. Quantos anos você tem?
– 40
Ele só ergueu a sombrancelha por cima do óculos de sol. E eu espero que tenha sido de surpresa e não porque talvez tenha aparentado mais idade hehe.
– E você?
– Adivinhe…
– Acho que uns 33.
– Não, 24 anos.
– O que você fazia na Palestina?
– Estudei comunicação e psicologia e trabalhava o dia todo. Era só o que eu fazia, estudar e ajudar a minha família.
– E para onde você gostaria de ir?
– Vou tentar aplicar para 3 países: Inglaterra, Bélgica e Canadá. Qual você escolheria se estivesse no meu lugar?
– Canadá com certeza. As pessoas na Europa estão cada vez mais xenófobas e os governos não estão ajudando nada os refugiados. O Canadá nesse sentido parece ser diferente. Tem uma sociedade mais aberta e o governo tem um bom programa para integração de refugiados no país.
– Boa resposta. Eu também quero mesmo é ir para o Canadá. Bom, adoraria ir para o Brasil também, mas ouvi dizer que São Paulo é muito perigoso.
– Pois é, mas voltando ao início da nossa conversa, qual é o seu desejo para você e para o resto do mundo?
– O meu?
– Sim.
– A única coisa que desejo é liberdade. Quando o ser humano tem liberdade, ele tem tudo. A vida é simples, muito simples.
Sorri e fiquei olhando para o mar por alguns minutos. Quando eu estava indo embora almoçar, ele disse.
– Gostei de conversar com você…
E me deu essa pequena flor branca.
Esta história é parte da série #RefugeesWelcome, relatos que escrevi durante o voluntariado que fiz no campo de refugiados de Souda, na ilha de Chios. São vários relatos que você pode acompanhar aqui no blog.
Se quiser ler mais sobre a minha experiência como voluntária no campo de refugiados na Grécia, confira aqui.