
Hoje parecia que o dia ia ser calmo como os outros. As caixas de comida já estavam na área de distribuição e nós voluntários já estávamos em nossas posições, prontos para começar. Mas havia algo diferente no ar. Na saída do campo vi um grupo de uns 10 homens se aproximar gritando e gesticulando muito.
Eles sentaram um ao lado do outro embaixo da tenda onde a comida é distribuída e a única coisa que eu podia entender era; No food. Today no food!!
Refugiados exaltados de um lado, tradutores no meio e os responsáveis pela distribuição dos alimentos do outro lado. A bagunça estava armada. Os refugiados gritavam de um lado enquanto os outros tentavam se defender.
– Onde estão nossos papeis? Queremos asilo, uma solução pra gente. Por que tanta demora?
– Calma, calma. Nós somos a empresa contratada para dar comida para vocês. Nós estamos deste lado, do lado de vocês. Nós não somos os responsáveis pela burocracia dos pedidos de asilo na Grécia.
– No food. No food. Vocês pensam que nós somos animais? A gente só come e dorme. Queremos ir embora daqui, queremos nossos documentos de uma vez.
– Olha, se vocês fizerem isso muita gente vai ficar sem almoçar hoje. Isso não é justo.
– E você lá sabe o que justiça significa?
A discussão só foi aumentando e tivemos que deixar a tenda. Todos os voluntários e as pessoas que trabalham para a empresa que distribui a comida fomos levados para o estacionamento, a área ¨segura.¨
Dali pude ver como estes pobres homens tentavam explicar a sua indignação, o seu cansaço e a sua ira. Falavam como podiam, todos juntos, gritando exaltados.
Depois de 20 minutos a polícia chegou e desceram vários homens com escudos de proteção e eu temi pelo pior. Meu coração ficou ainda mais acelerado e a única coisa que eu podia fazer era tirar fotos de onde estava, mesmo um pouco longe.
A impotência me invadiu mais uma vez, meus olhos voltaram a chorar e a minha raiva contra esta injusta parte do mundo só aumentou.
Estes homens estão cansados, muitos deles estão neste campo de refugiados à espera de uma resposta sobre o seu futuro há mais de um ano. Alguns reclamam da burocracia, outros da falta de informação e todos desejam liberdade.
Liberdade para seguir em frente, para imigrar para um novo país e traçar um destino diferente. Estes refugiados só querem ser ouvidos!!
Esta história é parte da série #RefugeesWelcome, relatos que escrevi durante o voluntariado que fiz no campo de refugiados de Souda, na ilha de Chios. São vários relatos que você pode acompanhar aqui no blog.
Se quiser ler mais sobre a minha experiência como voluntária no campo de refugiados na Grécia, confira aqui.