Como estou morando em Madri me senti mais próxima da guerra na Ucrânia e também mais preocupada e sem saber até onde isso ainda pode chegar. Por isso decidi fazer a minha pequena parte; juntei coragem, doações e viajei até a fronteira com a Polônia para fazer um voluntariado com ucranianos.
Cansada de ler notícias e também sentindo muita empatia pelos ucranianos, resolvi ser mais ativa e colocar meu grãozinho de areia para ajudar os ucranianos. Vou compartilhar em detalhes como surgiu essa ideia e como foi essa missão humanitária onde encontrei muita gente boa pelo caminho.
Redes sociais e conexões
A história resumidamente foi assim: escrevi uma pergunta em um grupo do Facebook de espanhóis que estão acolhendo ucranianos e perguntei se alguém queria ir comigo até a fronteira da Polônia para levar doações e ajudar no que fosse preciso.
No dia seguinte o Juan, um colombiano que também mora em Madri, respondeu dizendo que ele estava indo de carro até a Polônia para trazer ucranianos que quisessem vir morar na Espanha. Trocamos mensagens, nos encontramos e um dia depois pegamos a estrada para fazer 3 mil quilômetros de Madri até Medyka (uma das principais fronteiras entre a Ucrânia e a Polônia).
Missão humanitária
Na noite anterior da viagem conseguimos encher o carro com doações que o pessoal da @moloda_ucrania nos deu. Eles são um grupo de ucranianos que mora em Madri e que estão se mobilizando desde o começo da guerra.
O carro era grande e ficou completamente lotado com caixas cheias de roupas, medicamentos, fraldas, comida para bebê e tantas outras coisas que levamos.
A viagem durou 2 dias. Passamos pela França, Alemanha, República Checa até chegarmos na Polônia. Foi bastante cansativo e longo mas nada disso tirou a nossa empolgação. Durante o trajeto, enquanto o Juan dirigia, eu aproveitava para postar a nossa missão humanitária nas redes sociais e graças a isso consegui juntar 900 euros em dinheiro de doações de amigos, conhecidos e outras pessoas que se sensibilizaram com a causa.
Esse dinheiro ajudou a pagar parte da gasolina, pedágios e também as 3 noites de hotel da família ucraniana que foi para Madri (na volta), mas sobre isso eu conto mais pra frente.
Corrente do bem e brasileiros generosos
Durante a viagem foi uma emoção atrás da outra. Sem falar que eu sou super manteiga e me emociono super fácil. Quando entramos na República Checa e fomos pagar o primeiro pedágio, a moça que atendia viu que estávamos com bandeiras no carro e cheios de doações e disse que todos os veículos que estavam levando doações e ajudando os ucranianos tinham pedágio livre na República Checa inteira. Meus olhos encheram de lágrima.
Alguns quilômetros mais pra frente paramos para almoçar em um posto de gasolina. Eu saí do carro para esticar as pernas e quando voltei, tinha uma sacola cheia de alimentos em cima do meu banco. Eu não cheguei a ver a pessoa que deixou as coisas ali e deduzo que era uma doação para que a gente levasse para os ucranianos e foi isso que fizemos.
O G1 também fez uma matéria sobre a nossa viagem de voluntariado. Quem quiser ler está nesse link.
Graças aos contatos que fui fazendo pelas redes sociais, conheci duas brasileiras super generosas que moram na Polônia e nos hospedaram nas suas casas com todo amor, conforto e carinho.
Na última parte da viagem chegamos na casa da Adriana (uma das brasileiras que encontrei através do Instagram) perto da meia-noite. Ela mora em uma pequena vila na Polônia, a 180km da fronteira com a Ucrânia. Ela nos recebeu naquela noite fria, fez sopa típica dali e ainda nos emprestou a sua cama e outro quarto para que a gente pudesse descansar.
Isso foi em março e ainda fazia muito frio na Polônia. No dia seguinte fomos entregar as doações que vieram de Madri e fazia cerca de -2°C. Por sorte deu tudo certo e conseguimos entregar tudo a outro grupo de ucranianos que mora na Polônia.
Deixamos as caixas em uma grande van que no dia seguinte partiria para a Ucrânia, onde hoje há mais necessidade. Os jovens ucranianos ficaram super felizes e agradecidos por alguém do Brasil se preocupar com seu povo!
Depois de cumprir esse que era o nosso primeiro objetivo, partimos para o segundo: encontrar ucranianos que quisessem ir para a Espanha. Chegamos na cidade de Przemyśl, que fica bem próxima da fronteira, nesse mesmo domingo já no fim do dia e fomos direto para uns galpões enormes que viraram centros de acolhidas temporários.
Resgatando uma família ucraniana
Quando entrei ali meu coração bateu forte e não contive a emoção… a raiva, a tristeza e a dor de ver aquelas famílias só com uma mala (as que conseguiram trazer uma), cachorros, muitas crianças, todos com os olhares perdidos e resignados à espera de ajuda, tomou conta de mim.
Graças ao lado bom do ser humano que ainda é mais forte, ali dentro vi centenas de voluntários e muitas pessoas de várias nacionalidades oferecendo alojamento e carona para os refugiados para muitos países da Europa.
Fizemos a inscrição do carro e em menos de 20 minutos encontramos uma família ucraniana; o Dimitrio com a sua esposa e 3 filhas pequenas que tinham um conhecido na Espanha queriam ir para Madri. A comunicação não foi fácil porque eles não falavam inglês e eu não falo ucraniano, mas o Google tradutor nos salvou.
O Dimitrio me contou que demoraram 4 dias para conseguir sair de Dnipro, a cidade deles, até a fronteira com a Polônia. Estavam muito cansados e assustados. Depois de explicar os detalhes e oferecer essa carona, eles aceitaram e lá fomos nós.
Como já era muito tarde, outra brasileira generosa, a Ana, nos ofereceu descansar na casa dela. O nosso grupo era de 7 pessoas! Passamos essa noite fria lá e no dia seguinte eles preparam café da manhã para todos e depois disso o Juan partiu com a família de volta para Madri.
Voluntariado parte 2
Eu ainda fiquei na Polônia por mais 5 dias e fui até Medyka que é a fronteira mais movimentada entre a Ucrânia e a Polônia. Ali eu vi de perto como é a chegada dos ucranianos que passam muitos dias caminhando para conseguir cruzar até um país seguro para fugir da guerra.
Ali na fronteira vi centenas de ONGs, muita gente com o coração grande que deixou seus trabalhos e o seu dia a dia para chegar até ali e extender uma mão. Como eu sempre digo: ainda bem que no mundo tem mais gente boa do que ruim!
Uma das maiores ONGs que eu vi ali na fronteira, nas estações de trem próximas e também em Cracóvia é a World Central Kitchen.
Eles preparam comida e distribuem por lá e agora montaram até mesmo várias cozinhas dentro da Ucrânia. Um trabalho incrível!
Eu fui voluntária com eles no meu último dia em Cracóvia; ajudei a distribuir sopa, macarrão, chá e café para os ucranianos que decidiram ficar na Polônia e precisavam preparar seus documentos para legalizar a sua situação nesse país que já faz parte da União Europeia.
Outro pessoal que está na região desde o começo da guerra é a Clara, da Frente_Brazucra.
Ela é uma brasileira que mora na Alemanha e que alugou um carro para ajudar no resgate de brasileiros que estavam morando na Ucrânia, no início do conflito e está lá até agora. E olha que já se passaram mais de dois meses.
Escrevi esta matéria sobre o trabalho incrível que ela está fazendo para o UOL.
Como podemos ajudar?
Sempre digo que todos podemos ajudar de alguma maneira. Ter empatia e se colocar no lugar do outro é o primeiro passo.
Se você também se sensibilizou com a guerra da Ucrânia você pode, por exemplo, doar dinheiro para ONGs que estão trabalhando lá. Minha sugestão é que sejam pessoas que hoje em dia estão levando ajuda diretamente para a Ucrânia, como é o caso da Frente_Brazuca ou da World Central Kitchen. Digo isso porque vi a quantidade de ajuda e doações que está chegando do lado polonês e hoje em dia quem mais precisa é quem ainda está na Ucrânia.
O que você também pode fazer:
– doações em dinheiro
– doações de alimentos
– compartilhar o que eles fazem nas redes sociais
– fazer parte de grupos (o Facebook tem vários) que estão ajudando ucranianos
– repassar informação
– hospedar refugiados na sua casa por um tempo.
Família do Dimitrio
Muitos amigos que acompanharam a nossa viagem, me perguntam como está a família ucraniana. Eles chegaram em Madri com o Juan e no mesmo dia um grupo super generoso ofereceu uma casa para que eles possam ficar a 80 quilômetros daqui.
As meninas já estão na escola e eles estão se adaptando bem, aparentemente. Repito de novo o que digo sempre: ainda bem que o mundo está cheio de pessoas generosas e de bom coração!
Bom, essa foi a minha curta e intensa experiência como voluntária durante a triste guerra na Ucrânia. Espero que eu tenha conseguido te inspirar um pouco. Acredite, sempre podemos ajudar!!
Quem quier ler mais sobre voluntariado, neste post compartilhei a minha experiência como voluntária em um campo de refugiados na Grécia.
Se você tiver alguma dúvida ou quiser escrever algum comentário sobre voluntariado, vou adorar te ler!
Sempre podemos ajudar!